AMAR NÃO-AMAR
SOFRER NÃO-SOFRER
FELICIDADE? FELICIDADE?
quinta-feira, 20 de setembro de 2007
Sobre o tempo...
Alguns apontamentos a serem desenvolvidos posteriormente:
A questão do tempo intriga filósofos desde a antiguidade. Indagavam a respeito das coisas que os cercava, depois sobre o tempo e sobre o ser... (depois Heidegger retoma a tematica na celebre obra inacabada, Ser e Tempo)
Como medir o tempo, a história, o movimento?
Walter Benjamin também discutirá a questão do tempo....
Mas o que eu, eu mesma, estava pensando ontem quando assistia a TV, é que ainda hoje temos diferentes parâmetros de temporalidade. Ainda hoje, na África temos diversos povos, mesmo países inteiros, que se orientam pela luz solar, tem rituais de chá que duram, em média 3h.
Fico imaginando despreender esse tempo em nosso mundo capitalista desenvolvido?
....
A questão do tempo intriga filósofos desde a antiguidade. Indagavam a respeito das coisas que os cercava, depois sobre o tempo e sobre o ser... (depois Heidegger retoma a tematica na celebre obra inacabada, Ser e Tempo)
Como medir o tempo, a história, o movimento?
Walter Benjamin também discutirá a questão do tempo....
Mas o que eu, eu mesma, estava pensando ontem quando assistia a TV, é que ainda hoje temos diferentes parâmetros de temporalidade. Ainda hoje, na África temos diversos povos, mesmo países inteiros, que se orientam pela luz solar, tem rituais de chá que duram, em média 3h.
Fico imaginando despreender esse tempo em nosso mundo capitalista desenvolvido?
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terça-feira, 4 de setembro de 2007
Uma viagem,
As aventuras de uma jovem intelectual envolvem muitos livros, leituras, escritos, “viagens” e muita criatividade. Sou formada em filosofia. Mas aí já rola o desconforto: rotulo-me. Como se isso definisse a minha verdadeira essência, como se eu não tivesse uma real identidade, até mesmo, como se eu não fosse uma pessoa, fosse uma coisa. Estamos sendo e estando coisificados. Em seguida perguntam-me: Você faz o que? Eu penso, sempre penso... : Estudo! Estudo, pesquiso e escrevo. Assim como estou escrevendo para vocês agora, para que leiam e reflitam.
Partindo desta premissa, não posso escrever algo que não seja relevante para a vida prática de vocês. Certo? Errado. Vou contra a aplicação de um conceito preciso. Escrevo sobre algo abstrato, e que abrange o todo. E certamente não deve ser tomado como “auto-ajuda”. Pois a filosofia deve ser cultivada, semeada (no sentido literal) e não usada como um “manual”. A importância da propagação do saber filosófico é essencial para que as verdadeiras mudanças ocorram.
Como já disse “eu” estudo. Mas estudo o que? Estudo Teoria Crítica, Walter Benjamin (e a turma da Escola de Frankfurt). Mas o que isso tem haver com a sua vida? O que se pretende? Qual a finalidade? Aliás, finalidade é uma palavra muito em uso. É comum dizermos: para que serve? Qual o seu fim? O que importa é como iremos usar isso em benefício próprio. Como obteremos mais sucesso.
Hoje, a sociedade está tão fragmentada, dilacerada que o sentido de totalidade está perdido. Ao contrário do que se pensa, o indivíduo não está mais autônomo, livre, do que no final do século XIX. As amarras sociais estão confortavelmente dispostas. O indivíduo circula por esse “hiper-campo” de bens de consumo dependendo cada vez mais do sistema que o oprime. A liberdade foi perdida. Cabe a filosofia retomar a Razão. Ou em outras palavras fazer a revolução, mas como?
A filosofia da história de Benjamin já dizia que a emancipação dos indivíduos está muito ligada à imagem. A imagem daquilo que está abandonado, esquecido, do “fantasmagórico”. Já o teatro, a poesia de Bertolt Brecht (Perguntas ao operário que lê) o complementa. Numa postura quase didática prepara a classe operária, para aquilo que Benjamin conceitua como “rememoração”. Pois será através dessa rememoração que as atrocidades do passado vêem a mente e pode-se ter consciência de todo o mal que a humanidade cometeu. Pois como Benjamin afirmou em suas “Teses sobre o conceito de história” (1940): “Todo monumento de cultura é também um monumento de barbárie”. Assim, quando vemos as pirâmides do Egito, temos os milhares de escravos. Ou quando na convencional aula de história ouvimos sobre Alexandre, o grande, nunca paramos para pensar que ele não chegou às Índias sozinho. Mesmo aqui no Brasil, a questão dos indígenas oprimidos pelos colonizadores está sendo varrida para baixo do tapete a mais de 500 anos.
Um dos diversos papéis sociais da filosofia é esse, propor o esclarecimento. Nas minhas breves linhas de divagações queria explicitar, expor, apontar, delimitar. Para que a compreensão de algo tão importante não acabe se perdendo neste tempo em que a aparência, o consumo e as relações pessoais enfraquecidas estão em voga.
Partindo desta premissa, não posso escrever algo que não seja relevante para a vida prática de vocês. Certo? Errado. Vou contra a aplicação de um conceito preciso. Escrevo sobre algo abstrato, e que abrange o todo. E certamente não deve ser tomado como “auto-ajuda”. Pois a filosofia deve ser cultivada, semeada (no sentido literal) e não usada como um “manual”. A importância da propagação do saber filosófico é essencial para que as verdadeiras mudanças ocorram.
Como já disse “eu” estudo. Mas estudo o que? Estudo Teoria Crítica, Walter Benjamin (e a turma da Escola de Frankfurt). Mas o que isso tem haver com a sua vida? O que se pretende? Qual a finalidade? Aliás, finalidade é uma palavra muito em uso. É comum dizermos: para que serve? Qual o seu fim? O que importa é como iremos usar isso em benefício próprio. Como obteremos mais sucesso.
Hoje, a sociedade está tão fragmentada, dilacerada que o sentido de totalidade está perdido. Ao contrário do que se pensa, o indivíduo não está mais autônomo, livre, do que no final do século XIX. As amarras sociais estão confortavelmente dispostas. O indivíduo circula por esse “hiper-campo” de bens de consumo dependendo cada vez mais do sistema que o oprime. A liberdade foi perdida. Cabe a filosofia retomar a Razão. Ou em outras palavras fazer a revolução, mas como?
A filosofia da história de Benjamin já dizia que a emancipação dos indivíduos está muito ligada à imagem. A imagem daquilo que está abandonado, esquecido, do “fantasmagórico”. Já o teatro, a poesia de Bertolt Brecht (Perguntas ao operário que lê) o complementa. Numa postura quase didática prepara a classe operária, para aquilo que Benjamin conceitua como “rememoração”. Pois será através dessa rememoração que as atrocidades do passado vêem a mente e pode-se ter consciência de todo o mal que a humanidade cometeu. Pois como Benjamin afirmou em suas “Teses sobre o conceito de história” (1940): “Todo monumento de cultura é também um monumento de barbárie”. Assim, quando vemos as pirâmides do Egito, temos os milhares de escravos. Ou quando na convencional aula de história ouvimos sobre Alexandre, o grande, nunca paramos para pensar que ele não chegou às Índias sozinho. Mesmo aqui no Brasil, a questão dos indígenas oprimidos pelos colonizadores está sendo varrida para baixo do tapete a mais de 500 anos.
Um dos diversos papéis sociais da filosofia é esse, propor o esclarecimento. Nas minhas breves linhas de divagações queria explicitar, expor, apontar, delimitar. Para que a compreensão de algo tão importante não acabe se perdendo neste tempo em que a aparência, o consumo e as relações pessoais enfraquecidas estão em voga.
C´la vie
disponibilidade
acaso+química=?
relacionamento
querer ter, querer retribuir, querer ficar
intensidade
profundidade
imaturidade
não querer ter, não querer retribuir, não querer ficar
superficialidade
afastamento
dor
acaso+química=?
relacionamento
querer ter, querer retribuir, querer ficar
intensidade
profundidade
imaturidade
não querer ter, não querer retribuir, não querer ficar
superficialidade
afastamento
dor
segunda-feira, 3 de setembro de 2007
UFSCar/ A perspectiva surrealista de Walter Benjamin e A Interpretação dos Sonhos
Esta comunicação tem como base o ensaio, "O surrealismo. O último instantâneo da inteligência européia" (1929), o qual nos encaminha para uma visão singular da vanguarda para Walter Benjamin. Pois, para o autor, somente o dadaísmo e o surrealismo são considerados autenticas vanguardas artísticas. É nesse sentido de fundamentação que buscaremos na obra freudiana uma resposta para a “embriaguez” que Benjamin apresenta em seu ensaio. A interpretação dos sonhos (1899/1900), de Sigmund Freud, preencherá as lacunas do texto benjaminiano, na medida em que se fizer necessário. Buscaremos saber em que nível o “observador alemão” influenciou a interpretação desse movimento vanguardista que primava a psicanálise freudiana. A “crise da inteligência européia”, do conceito humanista de liberdade, está no cerne desta pesquisa, pois será a partir desta conjectura que será fomentado o terror, que Benjamin já profetizava neste ensaio.
quinta-feira, 30 de agosto de 2007
Outro olhar histórico: tese número 7 e a poesia brechtiniana
A proposta de um novo olhar histórico apresenta-se não somente nas “Teses sobre o conceito de história” (1940), como também em Alguns temas em Baudelaire (1936-1939), no ensaio “O narrador” (1936), na introdução da Origem do drama barroco Alemão e no livro das Passagens (Teoria do Conhecimento). Contudo é importante ressaltar que o pensamento constelado benjaminiano traz consigo elementos do romantismo alemão, do messianismo judaico e do marxismo, para então, formular uma interpretação original da História. Nessa interpretação está incutida a crítica ao progresso, ao positivismo que demarca os conceitos de história. Tal iluminação perpassa os escritos de Benjamin desde 1914 até 1940, ano de sua morte.
A crítica do progresso tem origem romântica, contudo ganha significado messiânico revolucionário. O conceito de progresso tem uma função crítica na sua origem, mas no século XIX, com a ascensão do poder da burguesia essa função vai desaparecendo gradativamente. A historiografia do século XIX torna-se, então, cúmplice da barbárie de toda a cultura. É sob esta perspectiva que se tem a necessidade de submeter o conceito de progresso a uma crítica imanente pelo materialismo histórico. A articulação com o materialismo histórico acontece por volta de 1924, para contestar as doutrinas do progresso ilimitado e contínuo da social-democracia e do comunismo stalinista.
A crítica veemente de Benjamin contra o progresso da própria humanidade vai em direção ás descobertas técnicas, ao desenvolvimento das forças produtivas e à dominação da natureza. Pois a utilização bélica das novas técnicas (aperfeiçoamento técnico dos meios de guerra) e máquinas só intensifica a exploração do próprio indivíduo. Sob essa perspectiva que a revolução é louvável, pois somente pela revolução que se atingiria a interrupção messiânica do curso da história. Nas “Teses” a crítica é mais radical e profunda a respeito das ideologias do progresso, Benjamin está tratando do declínio da experiência (Erfahrung) do mundo moderno, que se inicia com o advento da manufatura e a produção de mercadorias. Experiência no sentido de declínio da Erfahrung coletiva e a ruptura do encantamento libertador, ou seja, há uma destruição, por meio da técnica, da relação homem e natureza que deve ser reconciliada. As experiências passadas e as experiências presentes como uma revisão do passado pelo presente, ou seja, salvar o que foi esquecido.
O operário, segundo Benjamin, é o autômato impermeável à experiência, são os passantes na multidão, as massas amorfas. O poema de Brecht, Perguntas de um operário que lê, é exemplar nesta discussão: pois “quem construiu Tebas, a das sete portas?”. “A Babilônia, tantas vezes destruída, quem outras tantas a reconstruiu?”. Ou ainda, “a grande Roma está cheia de arcos do triunfo. Quem os ergueu?”. É nesse sentido que vai a discussão sobre o progresso e a história. A perspectiva da razão tem que ser enaltecida. Contudo a alegoria do autômato está sobressaindo-se. O caráter mecânico, vazio e repetitivo da vida na sociedade industrial. Os indivíduos têm que se conscientizar do seu passado, através da rememoração (Eingedenken), da redenção ao passado. A rememoração coletiva das sociedades sem classes, vivendo em estado de harmonia edênica com a natureza. Ou seja, o conceito de história benjaminiana, assim como a história para Hegel vai ter um telos, um fim. E este fim chegará quando o homem emancipado reconciliar-se-á com a natureza e com a sua própria Razão, e viverá no antiautoritarismo e antipatriarcalismo. Ou seja, quando o indivíduo atingir a sua completude, que é um processo de uma espera messiânica de redenção que cada geração transmite à seguinte; por isso da importância de uma historia narrada de geração para geração. Contudo o progresso que impedirá a realização dessa redenção. Na alegoria da tempestade (tese 5, 6, 7 e 9), o vento da história representa o vento do Absoluto, que sopra do Paraíso, mas a tempestade que se aproxima é o progresso. O homem deve ir ao encontro do movimento histórico, ou seja, do Absoluto. Ainda cabe afirmar que é sob o signo de um olhar surrealista que devemos buscar o passado prematuramente em ruínas, juntamente com a idéia de progresso, para então chegarmos a natureza da rememoração.
Retomando a poesia “didática” brechtiniana, é somente a revolução proletária que pode e deve operar a interrupção messiânica do curso da história. Será pelas forças de rememoração que os operários recuperarão a experiência perdida, que os orientarão para o futuro messiânico/revolucionário.
“O jovem Alexandre conquistou as Índias
Sozinho?
César venceu os gauleses.
Nem sequer tinha um cozinheiro ao seu serviço?
Quando a sua armada se afundou Filipe de Espanha
Chorou. E ninguém mais?
Frederico II ganhou a guerra dos sete anos
Quem mais a ganhou?
(...)
Tantas histórias
Quantas perguntas”
A figura do historiador aparece em 1936 no ensaio “O narrador”, ele possui traços do cronista – quer-se resgatar os antigos hábitos de contar, de narrar histórias, de colocar a imaginação e a rememoração em prática. Pois o autor desconfia do historiador racional que explica “exatamente” como aconteceram os fatos do passado, por meio de causalidades, ao invés de apresentá-los como ilustrações significativas. É desta forma, que o historiador das teses herda traços do cronista (tese 3). Por meio dessa argumentação que a ciência da história será suspeita de empatia à sistemática dos vencedores. Pois até hoje a história foi apresentada da perspectiva dos “fortes”, dos lideres e vencedores; se esquecem que para um líder ser forte muitos escravos e trabalhadores tiveram suas vidas aniquiladas, e povos inteiros foram oprimidos. Benjamin quer rememorar e narrar com veracidade esses fatos de opressão para que a revolução seja feita com consciência. A história deve ser entendida do ponto de vista da “classe combatente”, do verdadeiro ponto de vista universal e emancipador da história messiânica. Ou seja, há uma reapropriação de uma parte alienada das forças salvadoras.
A história deve ser entendida pelos povos oprimidos que ergueram os grandes monumentos. Não à história dos vencedores! Deve-se compreender que antes de um grande vencedor, herói ou ditador, há o povo. Desta maneira, o povo que deve ser alvo dos estudos, e não por uma “empatia” (conceito empregado pelo próprio Benjamin) que se deve estudar a história “limitada”. Sabe-se que os vencedores são os herdeiros dos que triunfaram antes, e ao estudarmos estes estaremos fortalecendo os dominadores. Fortalecendo no sentido de que o povo não se reconhecerá. A noção de justiça (tese 12) aparecerá, então, como uma vingança geral das classes oprimidas. Este será o motor da revolução social. O que é uma visão problemática: se todos clamarem em nome da vingança terá uma vingança ad infinitumm – na medida em que todos se acharam injustiçados e buscarem essa justiça. Em contrapartida essa noção de justiça benjaminiana se aplica ao “estado de exceção permanente”, ou seja, a uma política autoritária (leia-se fascismo) que é uma regra na história. Contudo o elemento concreto da libertação é o ato do historiador que salva um passado do esquecimento, para que posteriormente ele possa ser rememorado, esta é uma ação revolucionária. Salvar o passado da opressão e do esquecimento, resgatar à memória.
O poema de Brecht vai em direção aos escritos sobre a história crítica apresentada por Benjamin. Ele é exemplar pelo fato de demonstrar ao operário a sua importância no meio social em que vive, e que estava presente em todo o percurso histórico: sem os trabalhadores os heróis não seriam heróis; sem a opressão não haveria dominação. No entanto, o mais importante é a conscientização de que, na verdade, os trabalhadores que são os verdadeiros heróis, pois estavam ativamente ligados a cada empreitada de seu “senhor”. Fortalecendo, assim, a máxima de que “todo monumento de cultura é também um monumento de barbárie”. Não se testemunha a cultura sem se testemunhar também a barbárie. Theodor Adorno terá uma visão de cultura similar a de Benjamin, apresentadas, principalmente na Dialética do Esclarecimento (1947), Mínima Moralia e “Educação pós-Auschwitz”. Para Adorno a história do ocidente é contada desde o massacre cometido por Ulisses até Auschwitz, numa mesma escala. Logo, a cultura passa a ter um alvo certeiro para o nosso estudo, pois ela está impregnada de barbárie. Até mesmo o seu processo de transmissão está submetido ao aparato da barbárie. E qual é a solução proposta por Walter Benjamin? É a de que o historiador crítico se desvie da cultura bárbara; que compreenda o fio condutor da história no seu interior, que entenda as grandes civilizações, os grandes palácios e reinos, por aqueles que os habitavam. É justamente a tarefa, segundo Benjamin, de “escovar a história a contrapelo”.
Deve-se liquidar o elemento épico quando se estuda a história, como um impulso contra as falsas continuidades da história. A história dos oprimidos é um descontinuum; o problema é gerado quando os historiadores tradicionais nivelam num continuum todo o sofrimento e revolta (como, por exemplo, no caso de Auschwitz, que nominaram o genocídio, quando se usa a linguagem para denominar algo repulsivo isso não se torna mais tão asqueroso, ver “Educação pós-Auschwitz”, Adorno). Não se trata de análise dos massacres e opressões que existiram ao longo da história, é a crítica. A desumanidade não é somente regressiva, ela ultrapassa tudo o que já foi cometido. A proposta de outra história que não seja a dominante, para que não sejamos injustos com os milhares de trabalhadores e escravos anônimos de todos os tempos. Deve-se procurar aquela cultura autêntica e não bárbara que o passado nos transmite. A arte autêntica contém um caráter emancipatório, esses monumentos ditos culturais não: os palácios, os arcos do triunfo, a muralha da China só contém opressão. A arte salva do emudecimento e do esquecimento certas experiências da humanidade, conservam a esperança e a derrota. Assim, os sonhos que não puderam se tornar ação em seu tempo são petrificados. A crítica tem a tarefa de estudar as obras de arte produzidas, e “traduzí-las”, arrancando-as do esquecimento, rememorando-as. Essa é a contribuição do historiador crítico para escrever a “história dos vencidos”.
A acedia que Flaubert conhecia. Essa tristeza que os teólogos medievais apresentavam em seus textos. Já na Origem do drama barroco de Benjamin era analisada como “preguiça do coração” e “tristeza mortal”, será para fugir dela que o autor coloca o seu pensamento a favor da transformação social. Em nome da emancipação, da justiça e da felicidade. Assim, esse processo de conhecer o verdadeiro passado ganha um caráter de ação política integral. O método do pensamento histórico em Benjamin consiste em: memória involuntária; apreensão instantânea de uma imagem furtiva; salvação trazida por um perigo iminente e; classe oprimida constituindo o sujeito da história. O sujeito inserido desta forma na História é um sujeito finalizado que procura transcender-se, contudo, ele herda as revoltas do passado. O objeto histórico e o sujeito que conhece essa história estão ligados pela verdade (que deve sempre comprovar-se), pelo ato de revelar-se um ao outro. A libertação desse passado de opressão só ocorrerá quando houver uma detenção do processo histórico. Essa detenção ou “imagem dialética” é uma imagem do sonho da humanidade libertada. Este é um conceito difícil, pois Benjamin não o desenvolveu – mas pode-se dizer que segue o modelo da análise marxista da mercadoria. Mas em breves linhas, consiste em extrair uma imagem, recolher do passado e libertá-la da fantasmagoria que a condenou ao fracasso do esquecimento. O médium entre essa “imagem dialética” será a linguagem, que pela narração será transmitida pelas gerações. Assim, o presente tem influência tanto com o passado quanto com o futuro, haja vista que as gerações futuras só serão emancipadas se deterem todo o conteúdo em que os seus antepassados viveram. Sem as falsas continuidades que a história positivista nos apresentou. Walter Benjamin viveu a guerra, o nazismo, o exílio. Viu nascer uma república que se fundava em valores humanísticos, universais e democráticos: a República de Weimar. Mas esta sociedade civilizada gerou a maior barbárie do século XX. Nenhuma sociedade está imune a tais regressões do espírito, por isso que as “Teses” surgem como um sopro em meio a essa tempestade que se forma no céu, um sopro de esperança, para que se olhe para trás e recordem dos mortos desta carnificina histórica.
Referências Bibliográficas
BENJAMIN, W. Obras Escolhidas. Trad.: Sérgio Paulo Rouanet. 7 ed. SP: Brasiliense, 1994. (v.I)
____________. Obras Escolhidas. Trad.: Rubens Rodrigues Torres Filho e José Carlos Martins Barbosa. 5 ed. SP: Brasiliense, 1995. (v.II)
____________. Obras Escolhidas. Trad.: José Carlos Martins Barbosa e Hemerson Alves Baptista. 3 ed. SP: Brasiliense, 1994. (v. III)
LÖWY, M. Romantismo e Messianismo. Trad.: Myrian Veras Baptista e Magdalena Pizante Baptista. SP: Perspectiva, 1990. (Col. Debates, v. 234)
ROCHLITZ, R. O desencantamento da arte. Trad.: Maria Elena Ortiz Assumpção. Bauru, SP: EDUSC, 2003.
A crítica do progresso tem origem romântica, contudo ganha significado messiânico revolucionário. O conceito de progresso tem uma função crítica na sua origem, mas no século XIX, com a ascensão do poder da burguesia essa função vai desaparecendo gradativamente. A historiografia do século XIX torna-se, então, cúmplice da barbárie de toda a cultura. É sob esta perspectiva que se tem a necessidade de submeter o conceito de progresso a uma crítica imanente pelo materialismo histórico. A articulação com o materialismo histórico acontece por volta de 1924, para contestar as doutrinas do progresso ilimitado e contínuo da social-democracia e do comunismo stalinista.
A crítica veemente de Benjamin contra o progresso da própria humanidade vai em direção ás descobertas técnicas, ao desenvolvimento das forças produtivas e à dominação da natureza. Pois a utilização bélica das novas técnicas (aperfeiçoamento técnico dos meios de guerra) e máquinas só intensifica a exploração do próprio indivíduo. Sob essa perspectiva que a revolução é louvável, pois somente pela revolução que se atingiria a interrupção messiânica do curso da história. Nas “Teses” a crítica é mais radical e profunda a respeito das ideologias do progresso, Benjamin está tratando do declínio da experiência (Erfahrung) do mundo moderno, que se inicia com o advento da manufatura e a produção de mercadorias. Experiência no sentido de declínio da Erfahrung coletiva e a ruptura do encantamento libertador, ou seja, há uma destruição, por meio da técnica, da relação homem e natureza que deve ser reconciliada. As experiências passadas e as experiências presentes como uma revisão do passado pelo presente, ou seja, salvar o que foi esquecido.
O operário, segundo Benjamin, é o autômato impermeável à experiência, são os passantes na multidão, as massas amorfas. O poema de Brecht, Perguntas de um operário que lê, é exemplar nesta discussão: pois “quem construiu Tebas, a das sete portas?”. “A Babilônia, tantas vezes destruída, quem outras tantas a reconstruiu?”. Ou ainda, “a grande Roma está cheia de arcos do triunfo. Quem os ergueu?”. É nesse sentido que vai a discussão sobre o progresso e a história. A perspectiva da razão tem que ser enaltecida. Contudo a alegoria do autômato está sobressaindo-se. O caráter mecânico, vazio e repetitivo da vida na sociedade industrial. Os indivíduos têm que se conscientizar do seu passado, através da rememoração (Eingedenken), da redenção ao passado. A rememoração coletiva das sociedades sem classes, vivendo em estado de harmonia edênica com a natureza. Ou seja, o conceito de história benjaminiana, assim como a história para Hegel vai ter um telos, um fim. E este fim chegará quando o homem emancipado reconciliar-se-á com a natureza e com a sua própria Razão, e viverá no antiautoritarismo e antipatriarcalismo. Ou seja, quando o indivíduo atingir a sua completude, que é um processo de uma espera messiânica de redenção que cada geração transmite à seguinte; por isso da importância de uma historia narrada de geração para geração. Contudo o progresso que impedirá a realização dessa redenção. Na alegoria da tempestade (tese 5, 6, 7 e 9), o vento da história representa o vento do Absoluto, que sopra do Paraíso, mas a tempestade que se aproxima é o progresso. O homem deve ir ao encontro do movimento histórico, ou seja, do Absoluto. Ainda cabe afirmar que é sob o signo de um olhar surrealista que devemos buscar o passado prematuramente em ruínas, juntamente com a idéia de progresso, para então chegarmos a natureza da rememoração.
Retomando a poesia “didática” brechtiniana, é somente a revolução proletária que pode e deve operar a interrupção messiânica do curso da história. Será pelas forças de rememoração que os operários recuperarão a experiência perdida, que os orientarão para o futuro messiânico/revolucionário.
“O jovem Alexandre conquistou as Índias
Sozinho?
César venceu os gauleses.
Nem sequer tinha um cozinheiro ao seu serviço?
Quando a sua armada se afundou Filipe de Espanha
Chorou. E ninguém mais?
Frederico II ganhou a guerra dos sete anos
Quem mais a ganhou?
(...)
Tantas histórias
Quantas perguntas”
A figura do historiador aparece em 1936 no ensaio “O narrador”, ele possui traços do cronista – quer-se resgatar os antigos hábitos de contar, de narrar histórias, de colocar a imaginação e a rememoração em prática. Pois o autor desconfia do historiador racional que explica “exatamente” como aconteceram os fatos do passado, por meio de causalidades, ao invés de apresentá-los como ilustrações significativas. É desta forma, que o historiador das teses herda traços do cronista (tese 3). Por meio dessa argumentação que a ciência da história será suspeita de empatia à sistemática dos vencedores. Pois até hoje a história foi apresentada da perspectiva dos “fortes”, dos lideres e vencedores; se esquecem que para um líder ser forte muitos escravos e trabalhadores tiveram suas vidas aniquiladas, e povos inteiros foram oprimidos. Benjamin quer rememorar e narrar com veracidade esses fatos de opressão para que a revolução seja feita com consciência. A história deve ser entendida do ponto de vista da “classe combatente”, do verdadeiro ponto de vista universal e emancipador da história messiânica. Ou seja, há uma reapropriação de uma parte alienada das forças salvadoras.
A história deve ser entendida pelos povos oprimidos que ergueram os grandes monumentos. Não à história dos vencedores! Deve-se compreender que antes de um grande vencedor, herói ou ditador, há o povo. Desta maneira, o povo que deve ser alvo dos estudos, e não por uma “empatia” (conceito empregado pelo próprio Benjamin) que se deve estudar a história “limitada”. Sabe-se que os vencedores são os herdeiros dos que triunfaram antes, e ao estudarmos estes estaremos fortalecendo os dominadores. Fortalecendo no sentido de que o povo não se reconhecerá. A noção de justiça (tese 12) aparecerá, então, como uma vingança geral das classes oprimidas. Este será o motor da revolução social. O que é uma visão problemática: se todos clamarem em nome da vingança terá uma vingança ad infinitumm – na medida em que todos se acharam injustiçados e buscarem essa justiça. Em contrapartida essa noção de justiça benjaminiana se aplica ao “estado de exceção permanente”, ou seja, a uma política autoritária (leia-se fascismo) que é uma regra na história. Contudo o elemento concreto da libertação é o ato do historiador que salva um passado do esquecimento, para que posteriormente ele possa ser rememorado, esta é uma ação revolucionária. Salvar o passado da opressão e do esquecimento, resgatar à memória.
O poema de Brecht vai em direção aos escritos sobre a história crítica apresentada por Benjamin. Ele é exemplar pelo fato de demonstrar ao operário a sua importância no meio social em que vive, e que estava presente em todo o percurso histórico: sem os trabalhadores os heróis não seriam heróis; sem a opressão não haveria dominação. No entanto, o mais importante é a conscientização de que, na verdade, os trabalhadores que são os verdadeiros heróis, pois estavam ativamente ligados a cada empreitada de seu “senhor”. Fortalecendo, assim, a máxima de que “todo monumento de cultura é também um monumento de barbárie”. Não se testemunha a cultura sem se testemunhar também a barbárie. Theodor Adorno terá uma visão de cultura similar a de Benjamin, apresentadas, principalmente na Dialética do Esclarecimento (1947), Mínima Moralia e “Educação pós-Auschwitz”. Para Adorno a história do ocidente é contada desde o massacre cometido por Ulisses até Auschwitz, numa mesma escala. Logo, a cultura passa a ter um alvo certeiro para o nosso estudo, pois ela está impregnada de barbárie. Até mesmo o seu processo de transmissão está submetido ao aparato da barbárie. E qual é a solução proposta por Walter Benjamin? É a de que o historiador crítico se desvie da cultura bárbara; que compreenda o fio condutor da história no seu interior, que entenda as grandes civilizações, os grandes palácios e reinos, por aqueles que os habitavam. É justamente a tarefa, segundo Benjamin, de “escovar a história a contrapelo”.
Deve-se liquidar o elemento épico quando se estuda a história, como um impulso contra as falsas continuidades da história. A história dos oprimidos é um descontinuum; o problema é gerado quando os historiadores tradicionais nivelam num continuum todo o sofrimento e revolta (como, por exemplo, no caso de Auschwitz, que nominaram o genocídio, quando se usa a linguagem para denominar algo repulsivo isso não se torna mais tão asqueroso, ver “Educação pós-Auschwitz”, Adorno). Não se trata de análise dos massacres e opressões que existiram ao longo da história, é a crítica. A desumanidade não é somente regressiva, ela ultrapassa tudo o que já foi cometido. A proposta de outra história que não seja a dominante, para que não sejamos injustos com os milhares de trabalhadores e escravos anônimos de todos os tempos. Deve-se procurar aquela cultura autêntica e não bárbara que o passado nos transmite. A arte autêntica contém um caráter emancipatório, esses monumentos ditos culturais não: os palácios, os arcos do triunfo, a muralha da China só contém opressão. A arte salva do emudecimento e do esquecimento certas experiências da humanidade, conservam a esperança e a derrota. Assim, os sonhos que não puderam se tornar ação em seu tempo são petrificados. A crítica tem a tarefa de estudar as obras de arte produzidas, e “traduzí-las”, arrancando-as do esquecimento, rememorando-as. Essa é a contribuição do historiador crítico para escrever a “história dos vencidos”.
A acedia que Flaubert conhecia. Essa tristeza que os teólogos medievais apresentavam em seus textos. Já na Origem do drama barroco de Benjamin era analisada como “preguiça do coração” e “tristeza mortal”, será para fugir dela que o autor coloca o seu pensamento a favor da transformação social. Em nome da emancipação, da justiça e da felicidade. Assim, esse processo de conhecer o verdadeiro passado ganha um caráter de ação política integral. O método do pensamento histórico em Benjamin consiste em: memória involuntária; apreensão instantânea de uma imagem furtiva; salvação trazida por um perigo iminente e; classe oprimida constituindo o sujeito da história. O sujeito inserido desta forma na História é um sujeito finalizado que procura transcender-se, contudo, ele herda as revoltas do passado. O objeto histórico e o sujeito que conhece essa história estão ligados pela verdade (que deve sempre comprovar-se), pelo ato de revelar-se um ao outro. A libertação desse passado de opressão só ocorrerá quando houver uma detenção do processo histórico. Essa detenção ou “imagem dialética” é uma imagem do sonho da humanidade libertada. Este é um conceito difícil, pois Benjamin não o desenvolveu – mas pode-se dizer que segue o modelo da análise marxista da mercadoria. Mas em breves linhas, consiste em extrair uma imagem, recolher do passado e libertá-la da fantasmagoria que a condenou ao fracasso do esquecimento. O médium entre essa “imagem dialética” será a linguagem, que pela narração será transmitida pelas gerações. Assim, o presente tem influência tanto com o passado quanto com o futuro, haja vista que as gerações futuras só serão emancipadas se deterem todo o conteúdo em que os seus antepassados viveram. Sem as falsas continuidades que a história positivista nos apresentou. Walter Benjamin viveu a guerra, o nazismo, o exílio. Viu nascer uma república que se fundava em valores humanísticos, universais e democráticos: a República de Weimar. Mas esta sociedade civilizada gerou a maior barbárie do século XX. Nenhuma sociedade está imune a tais regressões do espírito, por isso que as “Teses” surgem como um sopro em meio a essa tempestade que se forma no céu, um sopro de esperança, para que se olhe para trás e recordem dos mortos desta carnificina histórica.
Referências Bibliográficas
BENJAMIN, W. Obras Escolhidas. Trad.: Sérgio Paulo Rouanet. 7 ed. SP: Brasiliense, 1994. (v.I)
____________. Obras Escolhidas. Trad.: Rubens Rodrigues Torres Filho e José Carlos Martins Barbosa. 5 ed. SP: Brasiliense, 1995. (v.II)
____________. Obras Escolhidas. Trad.: José Carlos Martins Barbosa e Hemerson Alves Baptista. 3 ed. SP: Brasiliense, 1994. (v. III)
LÖWY, M. Romantismo e Messianismo. Trad.: Myrian Veras Baptista e Magdalena Pizante Baptista. SP: Perspectiva, 1990. (Col. Debates, v. 234)
ROCHLITZ, R. O desencantamento da arte. Trad.: Maria Elena Ortiz Assumpção. Bauru, SP: EDUSC, 2003.
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