Caro leitor, tem dias que tudo parece acontecer com a gente. Sabe, não fatos isolados, mas uma avalanche de coisas. Isso nos dá uma sensação de estar fora do nosso corpo. Como se estivéssemos descolados do próprio corpo e nos projetássemos para fora. Pelo menos eu me sinto assim. Não sei você. Mas, com certeza, você, leitor, deve sentir alguma estranheza especifica quando seu dia está tomado por uma soma desenfreada de coisas.
Não sou dramática, sou realista. Temos muitas coisas para fazer, exigem-se muito de nós. Falo em nós, porque acredito que não estou “nessa” sozinha. Falo em nós, porque acredito que muitos têm esse sentimento. O sentimento de que 24 horas é pouco. O sentimento que o dia passa rápido demais.
A rapidez, a eficiência, a produtividade está sempre em primeiro plano. Temos metas, objetivos. Temos que gerar lucro, sempre. Mesmo no âmbito intelectual, ou até mesmo, artístico temos que seguir estas regras.
Eu vou ser bem sincera, quero mais sossego, uma casa no campo pelo menos por 15 dias no mês seria muito agradável. Sem o barulho dos motores, das buzinas, o caminhão (chatérrimo) do gás, e dos produtos de limpeza, se não me engano, Pamambi.
Quem não assistiu, assista, o clássico sempre atual “Tempos Modernos”, de Charles Chaplin, mesmo nos anos 1930, esse sentimento do rápido, do transitório e do efêmero já fazia parte do universo dos indivíduos. A alienação no trabalho, na vida, no lazer, na produção é fato consumado e permanente – pelo menos nesse sistema econômico.
Desde a revolução industrial estamos caminhando para o colapso do próprio homem, do próprio SER HUMANO. A subjugação do homem pelo próprio homem, ou seja, o domínio do homem por outro homem.
Mas eu estou fugindo do tema que eu propus para mim mesma nesta semana. Eu comecei falando em dias ruins, e acabei deixando no ar que todos os dias podem ser ruins no sistema capitalista, no qual poucos pensam e muitos executam, como na dicotomia execução-produção.
Mas o filosofar tem dessas coisas, a divagação é sempre um risco. Mas foi uma fuga consciente, porque esse tema da alienação e da nossa perda da identidade é realmente mais interessante, do que o meu dia ruim. Só porque no meio da madrugada o pneu do meu carro furou, o estepe estava murcho, e a bateria acabou, não é motivo de fúria e indignação para eu escrever aqui.
Temos que nos indignar sim pela nossa falta de tempo e tolerância, pela venda de nossas horas livres. Porque você sabe né? Nós vendemos a nossa força e nosso tempo para o patrão, quando aceitamos um emprego. E o valor que você vende o seu tempo livre é justo? Está justa a divisão dos lucros?
Eu não tenho aqui – neste pequeno e valioso espaço – pretensão alguma em fazer algum tipo de revolução. O próprio Marx já tinha “se ligado” de que o tempo para se fazer a revolução havia passado, que a tomada de consciência dos operários estava longe de acontecer. O século XX chegou, aumentou a classe média, e todos estavam atrelados em demasia ao sistema econômico ao adquirir bens de consumo. Esse trabalhador já era alienado o suficiente e não se reconhecia mais nos produtos que produzia.
Então, o que nos resta fazer? Cruzar os braços e ver o quanto robóticos nos tornamos?
O poeta Thiago de Mello, em “Os estatutos do homem”, sintetiza o sentimento de indignação que está me consumindo e me entristecendo. Mas neste trecho do Artigo XIII, a esperança de dias melhores me alegra: “Fica decretado que o dinheiro não poderá nunca mais comprar o sol das manhãs vindouras”. A esperança é sempre positiva.
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